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‘Joga fora e compra outro!’: a obsolescência programada

Para garantir consumo, algumas empresas determinam um “prazo de validade” dos produtos, que apresentam defeitos para serem substituídos

às 21h47
Carcaças de computadores acumulados em depósito: obsolescência pode ser técnica, mas também psicológica (Emerson Ferraz/GPE-Secom/Agência Brasil)
Carcaças de computadores acumulados em depósito: obsolescência pode ser técnica, mas também psicológica (Emerson Ferraz/GPE-Secom/Agência Brasil)
O professor Pedro Ivo da Silva Oliveira, do curso de Engenharia Mecatrônica da Unit Alagoas
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O nome é complicado e soa estranho, mas se refere a uma prática conhecida desde os anos 1920, usada em larga escala ao longo do século passado e agora combatida, por força das discussões sobre a questão ambiental e o direito do consumidor. Trata-se da “obsolescência programada”, na qual empresas e fabricantes planejam o envelhecimento de um determinado objeto ou produto, ou seja, programar quando determinado objeto vai deixar de ser útil e parar de funcionar, apenas para aumentar o consumo e garantir seus lucros. É como se fosse um “prazo de validade” definido antes da fabricação. 

Segundo o professor Pedro Ivo da Silva Oliveira, do curso de Engenharia Mecatrônica do Centro Universitário Tiradentes (Unit Alagoas), esta prática aparece em duas vertentes diferentes. Uma delas, a ‘obsolescência tecnológica’, é voltada ao tempo de funcionamento de um produto. “De acordo com o design e já na parte inicial de pensamento ali do produto, ele é pensado para durar um certo tempo específico. E após esse tempo, ele vai começar a ali a apresentar problemas tecnológicos que vão impedir que a pessoa que mantém esse produto continue a utilizá-lo da maneira que sempre fez. É a obsolescência que faz efetivamente o produto parar de funcionar, impossibilitando que seja utilizado”, explicou. 

Já a outra vertente é de teor comportamental, também chamada de ‘obsolescência psicológica’ e que, de acordo com Ivo, é estimulada pelo marketing das empresas para incentivar a compra e o consumo de seus produtos. “A intenção é sempre vender mais e mais unidades, e eles fazem com que você, psicologicamente, seja induzido, através de uma série de propagandas e de outros artifícios, a adquirir sempre as versões mais novas de um dado mesmo que a [versão] que você tenha não apresente problemas técnicos, por exemplo” acrescenta ele, citando o caso dos celulares e smartphones. “Apesar deles terem ali um um período de garantia, hoje em dia a gente sempre tá sendo impulsionado a comprar novas marcas de celulares, não necessariamente porque o nosso deixou de funcionar, mas porque saiu um novo, com outras funcionalidades”, exemplifica.

De olho neste consumo constante, alguns fabricantes costumam elaborar os produtos sem determinadas funções tecnológicas ou funcionais que poderiam ser incluídas agora, mas acabam usadas em novos modelos com lançamento programado para dois ou três anos. “Ele [o fabricante] já tem a tecnologia para lançar esse novo modelo, de forma que ele não contenha uma série de dificuldades que a futura versão agora contém. Mas o que é que ele faz? Ao invés de lançar um único produto já com todas as correções, ele vai lançar um que apresenta certos problemas, porque ele já prevê que em dois anos vai lançar uma nova versão, que as corrige”, exemplifica Pedro, acrescentando que, em alguns casos, a compra de uma nova versão não seria necessária.

Apesar de ser uma prática cada vez mais contestada, nem todos os lançamentos de produtos podem ser considerados como obsolescência intencional. O professor da Unit ressalta que algumas delas precisam ser lançadas para incorporar avanços tecnológicos, como no caso dos processadores de computadores e notebooks. “Antigamente, eles tinham uma capacidade de processamento baixa. Você não podia fazer certas tarefas que hoje são possíveis. Então, os computadores antigos ficaram obsoletos, mas isso não foi feito de uma forma necessariamente programada, porque a tecnologia evoluiu com o tempo. E com essa evolução, trouxe novas maneiras de se aumentar a capacidade de processamento dos computadores e fez com que os antigos deixassem de ser tão interessantes. A gente teve uma evolução ao longo dos anos que possibilitou isso”, disse. 

Prejuízos

Muitos especialistas que estudam o ramo apontam vários prejuízos causados pela obsolescência programada, incluindo para o meio ambiente. Já o professor Pedro Ivo aponta outro problema: o desgaste na relação de confiança entre marcas e consumidores, que vão se sentindo lesados. Um exemplo está em aparelhos que apresentam defeitos pensados desde o início. 

“Eu tive um computador de uma certa marca, que pouco depois da garantia começou a dar problemas severos de superaquecimento, até que ficou inutilizável. Eu pesquisei bastante e vi que todos os computadores dessa determinada marca têm um design que dificulta a dissipação de calor no circuito interno dos notebooks e passei a não comprar mais dessa marca. Então, isso traz um prejuízo de confiança para os consumidores, de não saber em que marca confiar”, relatou, ao qualificar o caso como uma obsolescência técnica. Para situações como essa, a saída do consumidor é buscar seus direitos junto aos órgãos de defesa, como os Procons. 

Já no caso da obsolescência psicológica, motivada pela propaganda, Ivo também qualifica isso como um prejuízo que afeta a mente da pessoa, que acaba motivada a comprar por impulso. Para ele, cada consumidor deve repensar individualmente os seus hábitos. “Eu acredito que nós, consumidores, hoje em dia, pensando como sociedade e como ambiente de consumo, temos que tentar cada vez mais procurar nos restringir às coisas realmente importantes em nossa vida. Talvez desapegar um pouco de todos esses itens que a gente vê hoje em dia nas propagandas, tentar avaliar um pouco na nossa vida, o que é realmente importante para nós. E tentar não cair no jogo das empresas, que tentam implementar esse tipo de obsolescência programada mais a nível psicológico”, conclui o professor.  

Ascom | Grupo Tiradentes

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